A realização da visão estratégica, fiel a intencionalidade da organização, implica na capacidade de formular e resolver “problemas bons” de maneira consistente e sustentável. O pensamento estratégico, assim, exige mais do que a capacidade de ver o que pode ser melhorado como um problema a resolver, mas, também, a elaboração e validação de hipóteses quanto as suas causas para, finalmente, viabilizar a adoção de ações para mitigá-las.
Entendendo “problema” em contexto amplo
A palavra “problema” geralmente carrega consigo uma conotação negativa. Entretanto, é importante que tenhamos a sensibilidade de reconhecer que, no dia-a-dia da gestão, há “problemas ruins”, sem dúvidas, mas também há “problemas bons”.
Gerenciar é resolver problemas.
Vicente Falconi |
A formulação de um objetivo estratégico, expresso em uma meta, por exemplo, apresenta um “problema bom”. Ou seja, algo que precisa ser “resolvido” e que, para isso, demandará esforço. Em outras palavras, objetivos estratégicos são “problemas bons” que nascem do desejo de melhorar e progredir.
Um “problema ruim”, por outro lado, é identificado nos desvios de consistência operacional (como, por exemplo, produtos sendo gerados fora das especificações). Problemas ruins não “avisam” quando chegam, tampouco são planejados. Um “problema ruim” destrói valor.
Objetivos estratégicos são “problemas bons”
Atingir um determinado volume de faturamento, com lucro desejado, por exemplo, é um “problema bom”. Atingir esses objetivos (faturamento e lucro) implica em responder “Por quê não faturamos e lucramos o que desejamos hoje?” e a resposta para essa pergunta direciona ações e iniciativas.
Objetivos estratégicos são “problemas complexos”
O framework Cynefin ensina a classificação de problemas em cinco domínios diferentes. Um problema será:
- simples ou óbvio, quando possuir apenas uma solução efetiva válida;
- complicado, quando possuir diversas causas possíveis, identificáveis antes de qualquer ação ser colocada em prática;
- complexo, quando também houverem diversas causas possíveis, porém identificáveis apenas a posteriori;
- caótico, quando não é possível, em qualquer momento, estabelecer relação entre possíveis causas e um problema;
- desordenado, quando não é possível determinar em qual das classificações anteriores um problema se encaixa.
A “solução” dos objetivos estratégicos é a criação de “tensões e estímulos”
Não há, para problemas identificados a partir de objetivos estratégicos, soluções diretas. Sabe-se apenas um pouco sobre as consequências de se atingir tais objetivos e, por associação, alguma clareza sobre algumas pré-condições necessárias para que essas “consequências” aconteçam.
De muitas formas, a expectativa com relação a iniciativas estratégicas é de que elas criem “tensões e estímulos” suficientes para direcionar o curso de acontecimentos à condição desejada.
Iniciativas estratégicas são estruturantes
Se o problema da empresa é ampliar a receita mediante a oferta de novos produtos, então, a ação estratégica é “estruturar” processos em torno de capacidades e competências para ofertar novos produtos (como mercadológico, pesquisa e desenvolvimento e etc) e não no desenvolvimento de um determinado produto especificamente.
Pensamento estratégico implica em “curiosidade saudável”
Problemas são sempre resolvidos pela mitigação de suas causas essenciais. Infelizmente, a natureza complexa da estratégia torna impossível determinar com absoluta certeza essas causas a priori, implicando sensibilidade para formulação de boas hipóteses que, por sua vez, demandam curiosidade.
Para cada efeito, existe uma causa raiz. Encontre e resolva a causa raiz em vez de tentar consertar o efeito.
Celestine Chua |
Uma empresa que vende pouco e tem produtos ruins, possivelmente, vende pouco por ter problemas ruins! Entretanto, é necessário reforçar que essa correlação, por mais forte que aparente, não implica em causalidade. Em nem todos os cenários, resolver o “problema” dos produtos ruins implicará em resolver o problema “vender pouco”.
O mundo corporativo demanda o equilíbrio entre necessidades infinitas e recursos limitados. O pensamento estratégico tenta reduzir, então, pela aplicação da seleção inteligente e da experimentação, esforços pouco efetivos.
“Problemas bons” são resolvidos com disciplina e método
O exercício do pensamento estratégico pode ser, por tudo que já foi dito, a prática sistêmica e disciplinada de identificar problemas, explicitando suas causas para, então, mitigá-las.
O planejamento estratégico é um método que concentra-se na identificação de problemas e causas e elaborar meios estruturantes para mitigação. A execução estratégica, sistematicamente, implementa os meios planejados, validando efetividade e promovendo os ajustes necessários.
A implantação de iniciativas estratégicas é sempre experimental e incremental. Ou seja, ocorre através de abordagem cíclica, qualificada de maneira contínua, pela repetição de ações de planejamento de tensões, execução, verificação dos impactos e ajustes menores. Em termos simples, o método para a execução da estratégia é PDCA!
O pensamento estratégico demanda avaliar, constantemente, se houve aproximação ou afastamento da meta que expressa o objetivo para, então, fundamentar a opção por perseverar ou buscar um caminho diferente.
Ferramentas úteis para o resolvedor de problemas estratégicos
A resolução de problemas eficiente começa com a capacidade de detectar suas causas para, então, determinar como atuar. Há um conjunto interessante de ferramentas para conclusão dessa atividade.
Os “cinco porquês”
A causa raiz de um problema quase nunca é evidente em primeira análise. Geralmente, as “causas” identificadas inicialmente não são mais do que efeitos da “causa raiz” que mereceria ser mitigada.
Uma técnica comum na busca pela causa raiz de problemas é aprofundar a análise utilizando, pelo menos, “cinco níveis de detalhamento” – técnica conhecida como “os cinco porquês”, sendo que as respostas costumam “transitar” entre sintoma, desculpa, (suposto culpado), causa e causa raiz.
Vejamos um exemplo comum dessa técnica:
- Por que está ocorrendo atrasos nas entregas? Porque o produto não sai da empresa no momento em que foi estipulado.
- Por que o produto não sai da empresa no momento certo? Porque a produção está atrasada.
- Por que a produção está atrasada? Porque não há matéria-prima suficiente para a produção.
- Por que não há matéria-prima suficiente? Porque o fornecedores não estão entregando o material dentro dos prazos que foram combinados com a empresa.
- Por que o fornecedor não está entregando o material dentro dos prazos? Porque esse fornecedor depende de entregas internacionais que não estão sendo cumpridas em função da lentidão alfandegária.
Diagrama de causa e efeito
Tão popular quanto a técnica dos cinco porquês é a utilização do diagrama de causa e efeito, também conhecido como diagrama de Ishikawa. Trata-se de uma ferramenta desenvolvida na década de 1943, reconhecida como uma das sete ferramentas da qualidade.
Sete ferramentas da qualidade
As “sete ferramentas do controle de qualidade” é uma denominação para técnicas gráficas específicas identificadas como as mais úteis na resolução de problemas que têm relação com o conceito de qualidade.
As sete ferramentas são:
- Fluxograma
- Cartas de controle
- Diagramas de causa-efeito (espinha de peixe ou diagrama de Ishikawa)
- Folhas de verificação
- Histogramas
- Gráficos de dispersão
- Diagrama de Pareto
A denominação tem origem no Japão pós-guerra, inspirada pelas famosas sete armas de Benkei.
Em sua estrutura, segundo a proposição original, o diagrama de causa e efeito, as prováveis causas para os problemas (efeitos) podem ser classificadas como sendo de seis tipos diferentes:
- Método ou processos de trabalho
- Material ou referências utilizadas
- Mão-de-obra
- Equipamentos utilizados
- Medidas ou indicadores de acompanhamento
- Influências do ambiente
Há quem utilize o diagrama de causa e efeito com outras categorias de problemas.
Duplo diamante
O método Duplo Diamante foi desenvolvido em 2005 pelo Conselho de Design do Reino Unido e, desde então, vem sendo usado como recurso para fomentar ideias de inovação.
O Duplo Diamante é um diagrama formado por quatro triângulos conectados, retratando quatro fases de um processo:
- Descobrir, operando em um brainstorming, sem restrições, operando em divergência, tentando clarificar, de fato, qual é o problema que se deseja resolver, combinando a visão de todos os *stakeholders*;
- Redfinir, que implica na análise dos “problemas candidatos” identificados na fase de descoberta, visando convergir os insights;
- Desenvolver, novamente operando em brainstorming, sem restrições, operando em divergência, visando levantar soluções candidatas para resolução do problema identificado na etapa anterior;
- Entregar, selecionando, a partir das alternativas identificadas na etapa de desenvolvimento, aquela considerada a mais adequada. Nessa fase, cria-se um protótipo da solução.
TL;DR…
A capacidade de identificar e, principalmente, resolver problemas é competência dissociável do pensamento estratégico. Afinal, todo objetivo estratégico é, em essência, um “problema bom esperando por uma solução ótima”.
Resolver problemas consistentemente implica no entendimento de suas naturezas. Para problemas estratégicos, que são naturalmente complexos, a solução quase nunca é direta e é realizada e só é possível pela criação de estímulos e tensões favoráveis. Geralmente, essas “tensões e estímulos” precisam ser aprimoradas sistematicamente, usando PDCA.
Um resolvedor de problemas é obsecado por identificar causas. Para isso, precisa utilizar boas ferramentas.